tempo, por cláudia moreira salles: luz que mensura o instante
19/06/2025
com geometria refinada e rigor construtivo, a arandela criada por cláudia moreira salles propõe uma reflexão sensível sobre a relação entre luz, matéria e o passar do tempo. lançada durante a dw! são paulo 2025, a luminária é formada por duas chapas metálicas circulares sobrepostas, que escondem a fonte de luz e deixam escapar um halo sutil e difuso pelas bordas, como um eclipse suspenso. ao centro, um ponteiro a ser girado permite que o usuário ajuste não apenas a intensidade da luz e a temperatura da cor, como também, simbolicamente, assumir o controle do próprio tempo.
nesta conversa, cláudia compartilha os bastidores do desenvolvimento da tempo, detalhando o processo criativo, as escolhas formais e os desafios técnicos que traduzem sua abordagem precisa e seu rigor no desenvolvimento de produtos para a lumini – uma colaboração iniciada em 2016, que já resultou em peças como sintonia fina, cavaled, tirante e gap.
“os gregos antigos compreendiam o tempo de forma dual, utilizando os conceitos de chronos e kairos. chronos é o tempo linear, mensurável e sequencial, enquanto kairos representa o instante oportuno, qualitativo e carregado de significado. essa dualidade é habilmente aqui traduzida, unindo funcionalidade e reflexão poética.” neste trecho, a curadora clarissa schneider menciona a dualidade entre chronos e kairos, conceitos filosóficos da grécia antiga, como um ponto central no design da tempo. como você traduziu essa ideia no design da luminária e de que forma ela se reflete no resultado final?
na verdade, o nome da luminária só surgiu depois da peça pronta. a interação do usuário ao acender e apagar a luz, e a possibilidade de dimerização por meio de um gesto, sugerem a possibilidade de poder medir e controlar o tempo.
a sobreposição das camadas metálicas é sutil, mas muito impactante. qual foi a sua intenção ao criar essa interação entre material, cor e luz? como essa dinâmica contribui para o conceito da peça?
cada componente da luminária tem uma função. a calota é uma superfície refletora, sempre branca para garantir maior eficiência, e sua forma côncava impede o ofuscamento e que a luz não ‘vaze’, criando sombras que interfeririam na forma da peça. o disco frontal esconde a fonte de luz e permite a fixação de uma haste que se assemelha a um ponteiro. esta haste é, ao mesmo tempo, um acionador da dimerização e um elemento gráfico importante na leitura da peça que joga com a forma e função.



o conceito de “moldar o tempo” com o ponteiro colorido, aliado à possibilidade de ajustar a intensidade e a cor da luz, realmente destaca a importância desse elemento na interação com a peça. como você vê a relação entre o ato de ajustar a luz e a ideia de controlar o tempo? qual o significado por trás dessa escolha de design?
a interatividade é um elemento desejável no design. intensidade e temperatura da luz criam diferentes sensações no ambiente. a haste da tempo proporciona uma experiência diferente de um dimmer tradicional de botão. o movimento feito para variar a luz é mais amplo, inusitado para este tipo de função.
a luminária combina um rigor técnico com conceitos mais intuitivos sobre o tempo. como foi o processo de equilibrar a funcionalidade prática com uma reflexão poética?
acho que a poesia surge do traço, da depuração da forma geométrica, do equilíbrio entre as partes. aliar forma e luz já é poético por natureza. o rigor técnico é essencial para que funcionalidade e subjetividade coexistam.




como você imagina que a experiência de uso impacta quem utiliza a luminária no dia a dia? em quais cenários ou ambientes você visualiza a arandela sendo inserida?
a tempo é uma arandela versátil, disponível em dois diâmetros. pode ser mais discreta quando toda em branco, com apenas a haste colorida, como um risco que corta o círculo; ou pode tornar-se mais marcante quando o próprio disco traz a presença da cor. ela pode estar em uma entrada, pontuando um corredor; em uma sala; ou mesmo um quarto. a interação cria uma relação mais próxima com quem usa a peça.
quais foram os maiores desafios durante o desenvolvimento da tempo?
o maior desafio foi técnico: o desenvolvimento de um potenciômetro que permitisse dimerizar manualmente a luminária.
como foi o processo de colaboração com a lumini para essa peça? houve alguma troca criativa interessante com a equipe da marca? você chegou a acompanhar a produção na fábrica?
minha relação com a lumini começou em 2016, com o desenvolvimento da linha sintonia fina. a complexidade dessa coleção exigiu componentes especiais e um alto nível de execução. o designer fernando prado e toda a equipe de produção foram fundamentais para o sucesso não só da sintonia fina, mas também das outras peças que criei para a lumini: gap, cavaled e tirante. as várias visitas que eu e gabriel bueno – designer que trabalha comigo – fizemos à fábrica lumini para acompanhar a produção foram essenciais para o amadurecimento dos produtos.